Cultivando a presença e o despertar na rotina diária
27/9/2022
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Na data em que escrevi este texto, fez dois meses e sete dias desde que assumi o meu lugar na docência junto ao colegiado de Psicologia do Centro Universitário UNITPAC e, curioso como sou, procurei conhecer quem seriam os meus pares, a gestão da instituição, sua hierarquia, seus colaboradores, a infraestrutura (me perdi algumas vezes para encontrar algumas salas), o modo de funcionamento e, certa vez, me surpreendi quando bati o olho no calendário acadêmico e entendi o significado de “Semana de trabalho efetivo discente”, um nome bem bonito para a popular “semana do saco cheio”.
Também curioso é o fato de que, a semana do saco cheio é uma espécie de folga reconhecida, um recesso não oficial, que normalmente acontece entre os dias 12 e 15 de outubro, que surgiu no começo da década de 90 (sim, é uma prática mais antiga do que achamos que é) e que se tornou difundida no contexto das escolas e cursos pré-vestibulares, buscando prover, em alguns contextos, um tempo extra para estudo antes das provas, ou ainda, um descanso antes dos exames e seleções de vestibulares que normalmente começam a acontecer a partir de novembro.
Ainda podemos pensar um pouco sobre o uso do termo “saco cheio”, uma expressão antiga e que se relaciona à sensação de aborrecimento, impaciência, cansaço ou desânimo - sentimentos comuns em contextos de rotinas de trabalho que se sobrepõem aos estudos, e ainda àquelas relacionadas às demandas da casa, da família, além do cuidado, conseguem mesmo. É provável que nunca tenhamos sido tão ocupados e é notória a quantidade de pessoas que estão esgotadas com suas demandas e rotinas crescentes (não somos chamados de sociedade do cansaço à toa).
Neste sentido, a escrita que teço aqui é um convite à reflexão sobre a importância da pausa para a continuidade da vida, em um mundo marcado pelo discurso do “trabalhe enquanto eles dormem”, do “tempo é dinheiro”, da supervalorização de uma ideia de felicidade e bem-estar a todo custo e qualquer preço, e da superexposição de vidas que não param e estão sempre apressadas, correndo atrás do vento, como diria um antigo pregador.
A pausa nem sempre recebe a devida importância, mas aqui, baseado na “pedagogia do ver”, proposta por Byung-Chul Han, em sua obra “Sociedade do Cansaço”, eu quero sugerir que ela se torne um momento para aprendermos a ver, no sentido de “habituarmos o nosso olho ao descanso, à paciência, ao deixar-aproximar-de-si, isto é capacitar o olho a uma atenção profunda e contemplativa, a um olhar demorado e lento [...] a não reagirmos imediatamente a um estímulo”, mas observarmos o que surge a nossa volta e dentro de nós com a devida atenção e tempo suficiente para darmos uma resposta consciente e elaborada.
Neste sentido, também me valho das influências orientais na Psicologia Comportamental que nos alerta para a importância de voltarmos a atenção para o nosso momento presente, entendido na ideia de “parar e sentir o perfume das rosas”, afinal, há muita coisa acontecendo ao nosso redor e passam despercebidas e, se dependermos de nossa agenda e solicitações, ficaremos desapontados, pois aparentemente não temos tempo suficiente para o cultivo da pausa. Finalmente, sabe-se que existem dois modos da mente que normalmente usamos, um modo automático de “solução de problemas”, ótimo para muitas situações em que precisamos dar uma resposta rápida ou tomar uma decisão ligeiramente, mas que pode se tornar um problema quando aplicado onde não é útil, ou quando utilizado ininterruptamente, e um segundo jeito, que é considerado como um “modo pôr-do-sol” - que nota, aprecia, observa, acolhe, sente, aceita e respira.
A sugestão, portanto, é que você esteja presente, e, para tanto, sugiro o comportamento de respirar profundamente e voltar a sua atenção para a sua respiração enquanto ela está acontecendo; de estar verdadeiramente presente na companhia dos seus queridos, prestando atenção na conversa que terão, na sensação que eles te causam, no calor da companhia e afeto de outrem; que você também consiga saborear bem o seu alimento - seu gosto, a textura, o odor, os movimento da deglutição, as memórias que ele evoca; e ainda os seus momentos de banho; quem sabe aqueles em que você decide praticar alguma atividade física ou hobbie; e, finalmente, o seu momento de descanso - quer você seja aquele aluno que consiga pausar durante toda a semana, quer você ainda continue indo para o trabalho ou desempenhando outras atividades, quer você decida estudar ou colocar conteúdos em dias.
Escrito por: Professor e Psicólogo Antônio Hugo