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Conheça a história do ITPAC contada no Livro Salve Doutor!

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Formando Médicos

Dedos sábios de rendeira

Tecem fios incontáveis

A trama do meu destino:

Fina renda nordestina

Improvisando cantigas

Sobre a almofada da vida.
(Pedro Tierra, A trama, In O Porto Submerso, 2005)

 

      No gabinete da direção geral da Faculdade de Medicina de Barbacena, um médico olha para o horizonte enquanto pensa nas atividades daquela semana. Há um ano, ele tinha assumido o cargo. E sabia da grande responsabilidade que tinha sobre os ombros. Mas ao imaginar e programar a lista de compromissos, uma espécie de filme passa pela cabeça dele. Ali naquele mesmo prédio estudara duas décadas antes. Um tempo de dificuldades.

     Era o Filho mais velho de uma família de cinco irmãos, tinha nascido a 170 quilômetros de Barbacena. Na pequena Argirita, cidade da zona da Mata Mineira, ás margens do Rio Pardo, onde quase todas as fazendas tinham alambique para produção de cachaça, açúcar preto e rapadura. Era do Sítio que os pais tiravam o sustento da meninada. Na cidade, de pouco mais de dois mil habitantes, todos se conheciam.          

   

Mas o primogênito não queria trabalhar na roça e nem cuidar de alambiques. Pelo contrário. Não lembro de falar de outra profissão. Eu dizia que ia se médico. E aí, meu pai sabia que a única maneira de mudar o destino dos filhos era através da educação. Sempre incentivou, deu todo apoio. Foi uma luta muito grande. Eu consegui realizar meu sonho. E ele realmente conseguiu mudar nossos destinos. Ele estava certo.

    Antes de descobrir Barbacena, morei em Belo Horizonte, Juiz de Fora, e acabei indo para faculdade particular, mas através de um crédito educativo que tinha na época. E lá me formei, entre idas e vindas. Consegui me formar, fiz residência em traumato -ortopedia, no Rio de Janeiro.

        De repente, o telefone toca e interrompe os pensamentos:

         -Nicolau, Vamos lá no Tocantins?

         - Uai, fazer o que lá naquelas bandas?

   Do outro lado da linha quem fala é o secretário de saúde de Minas Gerais, o também médico Vilmar de Oliveira Filho. Os dois tinha estudado na mesma época, na Faculdade de Barbacena. Tinham também em comum o exercício da função de secretário de saúde. Nicolau Carvalho Esteves havia sido secretário de saúde de Barbacena, em 1993, quatro anos depois se tornara diretor geral da faculdade. A amizade tinha fortalecido.

   Vilmar rapidamente conta, por telefone, que conheceu numa das reuniões do Conselho Nacional da Secretária Estaduais de Saúde, o Conas, o secretário tocantinense, Eduardo Medrado. E também se tornaram amigos. Numa das Conversas, Medrado fala da dificuldade de implantar os serviços médicos no Tocantins por não ter uma faculdade de medicina, pela dificuldade que se tinha de ter este tipo de profissionais no Estado. E aí, como visionário que era, ele comentou isso com o Vilmar. O Vilmar disse:

   -Tenho um amigo que é diretor de uma faculdade de medicina e conhece todos estes trâmites.

Medrado diz:

  -Ah, é mesmo? Então, me dá o telefone dele, que eu vou entrar em contato.

Vilmar responde:

  -Pode deixar que nós vamos ao Tocantins.

   Opa! Não estava nos planos, pelo menos não naquele momento, ampliar de tal forma o braço da Instituição que dirigia , pensou Nicolau. Mas também, dono de um espírito empreendedor, ele decide percorrer dois mil quilômetros entre as duas cidades.

    Vim pra passear, para pescar, mas de menos para abrir uma faculdade de medicina, relembra. Achei que não tinha condição nenhuma, e já me estranhei, quando eu vi a ideia do Medrado era fazer a faculdade de Medicina em Araguaína. Eu achei Araguaína uma cidade que, no meu entendimento, não tinha uma facilidade que tinha hoje... as coisas eram mais difíceis. Eu achei impossível.

    Eles desembarcaram em Palmas alguns dias depois. Ao chegar à capital, Nicolau decide fretar um avião pequeno para ir até Araguaína. No aeroporto, a aeronave monomotora tem capacidade para cinco passageiros, além  do piloto. Decola com a capacidade máxima. Ao lado do piloto, viaja o secretário de saúde Eduardo Medrado. Os visitantes estão atrás. Até que:

 

- Volta agora!

O piloto assustado, pergunta:

- O que aconteceu?

- Eu quero voltar, diz um agoniado Nicolau.

   Todos se olham sem entender. Vilmar e Medrado perguntam, quase que ao mesmo tempo:

- Tá passando mal Nicolau?

    Ele não quis justificar. Mas insistiu para que o piloto voltasse à pista, imediatamente.  E ele voltou.

     Ao abrir a porta do avião para descer, o alívio.

-Eu fico aqui, disse o médico mineiro.

-Uai, você não vai com a gente para Araguaína?

- Eu fico, insistiu. Mais vocês podem seguir.

Eles foram. Sem Nicolau Esteves. O médico tinha pavor de viajar em avião pequeno.

. . . . .

Na semana seguinte finalmente Esteves chega a Araguaína. E acompanhado pelo irmão, César Esteves, também médico em Minas Gerais.

    Eu vi que tinha um vôo direto da Varig de Brasília para Araguaína. Quando cheguei fiquei estupefato com o que vi naquela cidade. A cidade era pujante, muito boa, não era nada daquilo que eu pensava. A cidade era realmente interessante.

No desembarque a surpresa o aguardava.

Ao descer do avião no aeroporto de Araguaína eu vi um tumulto muito grande na recepção do aeroporto. Fui caminhando em direção ao aeroporto vendo aquele tumulto na recepção. E achei:

 -deve ter vindo algum artista neste avião, junto comigo, alguma personalidade.

E aí , não me esqueço, fui recebido pela doutora Ana Tahan.

Ela disse assim:

-O senhor que é o doutor Nicolau?

-Sou eu mesmo

Aí, todo mundo começou a bater palmas.

E eu fiquei sem saber o que dizer o que fazer. Justamente a imprensa me entrevistando:

- O senhor vai abrir uma faculdade de medicina aqui?

   Ele respondeu sem se comprometer. E o grupo desceu em direção à cidade. Numa passeata improvisada. No carro, o pensamento de Nicolau ia mais acelerado. Sem saber o que fazer, porque faculdade de Medicina era uma coisa que dependia de um processo. Eu vinha para entender as condições. Mas a recepção tinha sido extremamente calorosa.

    A classe médica, representantes do Sindicato Rural, dos hospitais, da educação, da prefeitura, todos manifestaram apoio. E que me deixou assim muito entusiasmado com o projeto.

Mais tarde, depois de almoçar, o grupo se reuniu.

    Eu fui conhecer os hospitais, fui conhecer a logística. Eu realmente me encantei com o projeto. Fiz alguns compromissos, mas com muita cautela. Porque eu sabia que abrir uma faculdade de medicina não seria uma tarefa muito fácil assim. E as pessoas não tinham dimensão pela vontade, pela garra, pelo entusiasmo, elas não tinham dimensão do tamanho do passo que a gente estava dando ali.

    O passo era grande. Fora dado. E não tinha mais como voltar atrás.

   Nicolau Esteves, na época com 46 anos, retornava para Minas Gerais, ciente da promessa que fizera. Conversei com meu amigo o deputado federal Bonifácio Andrada, que era o reitor de uma grande Universidade que estava despontando no Estado, a Universidade  Presidente Antonio Carlos, Unipac, da qual a faculdade de medicina fazia parte.

   Ele descreve ao reitor, a intenção de seguir para o Tocantins para abrir uma faculdade de medicina. Bonifácio Andrada já conhecia tudo dos meandros, da legislação, para abertura de um curso. Quando falei do Tocantins ele me surpreendeu dizendo que era muito amigo do governador Siqueira campos, porque tinha sido colegas de parlamento.

    O próprio reitor decide ligar para o governador. Quando Siqueira Campos viu que era Bonifácio Andrada ficou mais entusiasmado ainda. O Medrado já tinha conversado com ele, logicamente, mas não sabia que era o Bonifácio Andrada.

     Siqueira Campos se entusiasmou, mandou a gente vir imediatamente, que ele ia fazer o que fosse necessário, do ponto de vista burocrático. Para a gente instalar uma faculdade de medicina aqui.

    Quinze dias depois, Nicolau retorna ao Tocantins. Só que desta vez o destino seria a Capital. Ele traz a mulher, Rosângela Esteves, também médica. Ela o acompanharia em várias outras viagens ao Tocantins, durante o processo de implantação da faculdade.

   Outro personagem médico também entra neste momento da Instalação da faculdade. Neilton Araújo, secretário municipal de saúde de Palmas. Pessoa que contribuiu muito para este estado, para várias coisas, inclusive futuramente para a abertura da Faculdade de Medicina da universidade Federal do Tocantins (UFT).

  Segundo Esteves, Neilton queria que a gente instalasse a faculdade aqui na capital. E inclusive, isso criou, digamos, certa animosidade entre ele o e o Medrado. Porque ele queria que a faculdade fosse aqui. Mas, mais uma vez o Medrado foi um sábio. Porque ele disse, e isso ele falou comigo:

   -Nicolau, nós temos que implantar a faculdade de medicina em Araguaína, porque eu hoje, pelo cargo que eu ocupo, eu tenho força para trazer para Araguaína. Palmas é a capital, Palmas, eu não tenho menor dúvida, vai ter sua faculdade de medicina. E Araguaína é agora é comigo. E nós temos que fazer primeiro em Araguaína.

  Eduardo Medrado e o governador Siqueira Campos apostavam na descentralização do ensino. Na época, estava o problema dos médicos cubanos aqui, que foi o primeiro Estado, onde hoje nós temos o Mais Médicos. Mas iniciou naquela época tal a dificuldade que tinha para implantar os mais médicos aí (aponta como se dissesse ‘no Brasil’).

  Depois deste novo encontro, em Palmas, deu-se, por fim, o início ao processo de abertura da faculdade de Medicina em Araguaína. Conseguimos abrir em 1998, cursos de Pedagogia e Ciências Contábeis. Em 1999, abrimos o curso de Medicina.

  Foi necessária uma adequação da legislação. Os primeiros cursos foram autorizados pelo Conselho Estadual de Educação do Tocantins: Ciências Contábeis, Pedagogia, Enfermagem, Odontologia, Farmácia. Depois, Medicina.

  Quando a primeira turma formou, em 2005, demos entrada no Ministério da Educação, no Sistema Federal de Ensino. A partir daí, a escola foi migrada do Conselho Estadual para o Conselho Federal.

  Mas, quando a primeira turma de médicos se formou, a migração não havia sido publicada ainda. Os médicos formados pelo Instituto Presidente Antônio Carlos (ITPAC), em Araguaína já estavam trabalhando, uns seis meses depois cassaram o diploma deles, a inscrição deles no Conselho Regional de Medicina.

  Aí foi um caos, os meninos fizeram uma pressão, mas ainda não tinha sido publicada aquela migração nossa do sistema estadual para o federal. Estes próprios alunos, eu os ajude, foram pra Brasília, e lá se mobilizaram entre eles mesmos. Foram ao Ministério da Educação, e aí em uma semana, quinze dias depois, foi publicada esta migração e os alunos retornaram com seu registro.

  O fato foi marcante. A gente não esperava isso.

    Passados 15 anos da fundação, a escola recebe alunos do Brasil inteiro. O povo de Araguaína me trata com a maior deferência, que não sei eu mereço, diz emocionado. Mas eu tenho muito orgulho. O grupo tem outras faculdades, inclusive hoje já temos outro braço, em Porto Nacional.

   Porto Nacional foi outro desafio. Em 2004, nós assumimos a escola lá justamente pelo projeto que já tínhamos em Araguaína. Mas também  o apoio  que nós recebemos da cidade,dos órgãos constituídos,do governo do Estado,mais uma vez. Nesta época, era o Marcelo Miranda, o governador do Estado.

   Na histórica Porto Nacional, foi edificado um complexo que muito nos orgulha. Os projetos dos médicos mineiros no Tocantins são especiais. A gente abriu outras escolas em outros lugares, mas não conseguimos replicar o mesmo calor Humano, o mesmo carinho que a gente teve e até o desenvolvimento da própria instituição não foi igual como nestas duas.

   Nicolau Esteves, que também atuou como professor de medicina, defende que isso se deve mesmo a população, a comunidade local e a vontade destes governos de realmente implantar aqui a faculdade.

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